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ENEM: muito além da velha mídia

Posted by Liberdade Aqui! em 01/11/2011

Do Direto da Redação

O ENEM, a cidadania e as redes sociais

Rodolpho Motta Lima

E eis que se deu a esperada  prova do ENEM, versão 2011. Como professor e ator dentro desse processo, não quero deixar de opinar. Parecia que, desta vez, do ponto de vista administrativo, sua aplicação tinha tido um número de problemas bem menor do que nas edições  anteriores, mas o episódio do Ceará – de vazamento de questões para alunos de um determinado colégio  – acabou manchando o brilho do certame.

O Ministério de Educação, nesse caso específico, tem razões para supor que o problema tenha sido gerado  por ato delituoso no âmbito do próprio colégio envolvido – pré-teste copiado e divulgado indevidamente –    e rejeita a tese da elaboração de uma nova prova nacional, argumentando, analogicamente, com procedimentos do SAT – teste de seleção americano semelhante ao ENEM – que, quando se defronta com fatos da espécie, apenas cancela e refaz a prova das pessoas atingidas, já que o sistema da TRI – Teoria de Resposta ao Item  – garantiria o princípio da isonomia pela formulação de provas com o mesmo nível de abrangência e dificuldade. De qualquer forma, tem o Ministério que defrontar-se, agora, com desconfortáveis pedidos de anulação.

Casos como esse, e outros, só robustecem minha opinião de que o ENEM, sem perder as suas características e mantendo os seus objetivos, poderia e deveria ser regionalizado.  Em um país de dimensões continentais como o nosso e para um universo que, neste ano,  esteve em torno de cinco milhões de candidatos, será sempre possível que ocorram situações pontuais em que os prejudicados propugnem pela anulação integral do concurso. A regionalização constituiria a diversidade, mas mantida a unidade, porque a TRI, complexo modelo matemático de aplicação eficaz em muitas partes do mundo, permite a efetiva comparação entre indivíduos da mesma população que tenham sido submetidos a  provas diferentes.

Em ocasião anterior, já tive oportunidade de externar minha posição favorável ao ENEM, pelo que ele traz de novo para o cenário da educação. Sou totalmente contrário à volta do vestibular tradicional. O ENEM traz em si sementes que, prosperando, tendem a alterar o comportamento das escolas, do ponto de vista metodológico e pedagógico. A partir de matrizes de competências e habilidades, o ENEM está ditando uma  nova forma de propor questões,  calcadas em princípios de contextualização e de interdisciplinaridade que tentam afastar do que é cobrado a questiúncula inútil, o problema de algibeira ou as chamadas “pegadinhas”. Ele está obrigando, assim, a um repensar geral daquilo que se faz em sala de aula, provocando uma revisão do tradicional enfoque essencialmente “conteudístico” , substituído por um tratamento muito mais voltado para a formação de um competente “leitor do mundo”   do que para o estímulo aos recursos de memorização, a “decoreba” que a pedagogia moderna rejeita.

Podemos atestar esse viés mais amplo do ENEM na sua prova  de Linguagens:  o que até bem pouco tempo era, na tradição do vestibular, tão somente uma prova de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira transformou-se, no ENEM, em um conjunto coerente de questões que incorporam, além de aspectos linguísticos e literários propriamente ditos,  o processo de produção e recepção das Artes em geral, o exame dos  chamados gêneros digitais,  seu impacto e função social,  e a linguagem corporal, com suas práticas de integração social e formação da identidade.

Quem se debruçar com atenção na análise das questões propostas pelo ENEM, verificará, também, que elas se voltam para assuntos que permitem a caracterização da prova como uma “prova cidadã”, pelos objetivos de sua formulação.

Voltando à prova de 2011, vale mencionar, aqui, como elemento relevante do exame, a redação. O ENEM tem sempre proposto, em suas redações, temas de natureza social, que envolvem, além da análise crítica pelos candidatos – com argumentação que se quer consistente e coerente –  um posicionamento que encaminhe soluções de intervenção .  O tema, agora, foi “Viver em rede no século XXI: os limites entre o público e o privado”. Como sempre faz, a banca disponibilizou “textos motivadores” e solicitou que fosse apresentada, em um trabalho dissertativo-argumentativo com uso da norma padrão, “proposta de conscientização social que respeite os direitos humanos”.

Esse é um tema muito caro ao jovem, muito próximo a ele e sobre o qual , no geral,  possui domínio que lhe permita escrever com propriedade a respeito. Além disso, a  própria prova abriu um leque de opções para desenvolvimento do assunto, por meio dos  textos auxiliares  que serviram de “dicas” para diferentes caminhos de abordagem. Enquanto um deles mencionava o acesso à rede como um direito fundamental do ser humano (declarado pela ONU) e falava da  mobilização mundial no sentido do  acesso livre e gratuito, outro procurava explorar, com dados estatísticos, a crescente participação das pessoas em redes sociais, como “parte da própria socialização  do indivíduo do século XXI”.

Não faltaram aos textos, contudo, elementos propícios ao juízo crítico sobre a Internet, em afirmações que convidavam os usuários a “saber ponderar o que se publica nela” ou advertiam quanto ao fato de que a rede – sendo social –  não pode acobertar anonimato, devendo os que extrapolam os limites do razoável pagar caro pelas suas ações. Uma “tirinha” que também compôs o rol dos textos auxiliares levava a pensar – com humor cáustico – em como se estão estabelecendo na sociedade,cada vez mais, mecanismos de monitoramento das pessoas.

É claro que não se podem  esquecer, aqui em nosso país,  os milhões de ainda excluídos das redes sociais, aqueles aos quais ainda é negada a inserção plena na sociedade e o amplo acesso ao mundo que a internet possibilita. E é evidente, por isso mesmo, que muitos dos nossos jovens participantes da prova do ENEM devem ter apresentado, no tratamento do tema, uma visão mais restrita do que aqueles que têm nas redes sociais algo pertinente ao seu cotidiano. Pertinente e muitas vezes  perigoso, pela tensão entre a  conveniência de, em nome da segurança pessoal,  observar-se uma certa privacidade, e a necessidade, marca do tempo em que vivemos,  de uma exposição escancarada de hábitos e posturas. De qualquer forma, por carência ou até por excesso, todos devem ter tido o que dizer.

Não resisto, aqui, a uma observação final:  como educador no Rio de Janeiro, onde o acesso é mais amplo,  percebo –  assunto, talvez, para outra coluna –  que a internet,  embora esteja efetivamente incorporada ao dia a dia dos jovens em geral como instrumento que facilita a aproximação em torno de  interesses comuns (através do Orkut, MSN, Facebook, Twitter), ainda não atua conforme se espera na ampliação do universo cultural dos alunos ou como veículo auxiliar dos seus estudos, seja porque ainda é tênue a sua presença como recurso institucional disponível  no próprio ambiente escolar, seja porque no âmbito doméstico predomina, por parte dos pais, a omissão quanto a estímulos  nesse sentido. Há quem diga até que a internet está minimizando o hábito da leitura regular dos bons textos literários e contribuindo para que os jovens escrevam menos, quantitativa e qualitativamente. De qualquer forma, e como muitos já disseram repetidas vezes, o problema não está na internet, esse excepcional veículo de integração, mas no uso restrito e às vezes pouco positivo que dela se faz.

___________________

Sobre o autor deste artigo

Rodolpho Motta Lima

Advogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.

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“Não há maneira maior de perpetuar desigualdades do que tratar de maneira igual aos desiguais.”

Posted by Liberdade Aqui! em 12/06/2011

DO TIJOLAÇO

Quem sabe a gente não defende uma cobrança de IPVA igual para os dois carros, por serem ambos amarelos?

É uma afirmação antiga a de que não há maneira maior de perpetuar desigualdades do que tratar de maneira igual aos desiguais.

A matéria que O Globo publica hoje sobre as pressões das construtoras e dos bancos para que se reajustem os limites para financiar valor máximo dos imóveis comprados com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), de R$ 500 mil para R$ 750 mil é bem um exemplo disso.

Não tenho nada contra que alguém compre um imóvel de R$ 600 mil, ou R$ 1 milhão, ou R$ 10 milhões. mas não com crédito subsidiado, não é?

O exemplo citado na matéria – um eventual trabalhador com R$ 400 mil no Fundo -, quenão poderia comprar um apartamento de R$ 510 mil, mostra, se a gente parar um pouco para pensar, o absurdo da situação. Alguém, para ter R$ 400 mil no Fundo, que representa mais ou menos um salário por ano trabalhado (8% do salário ao mês x 12 meses  = 96%), pra acumular este valor em 20 anos de trabalho, teria de ter ganho um salário médio de R$ 20 mil mensais, durante este período.

Ora, quem ganha R$ 20 mil por mês há 20 anos não é um “sem casa” ou, se é, é pela opção de morar muito bem pagando aluguel, em lugar de ter adquirido um imóvel de padrão de classe média.

Este valor – ninguém questiona – é patrimônio do titular da conta, e será sacado nas condições do FGTS – aposentadoria, invalidez – mas não pode sair para compra de imóveis de alto padrão por uma razão simples e intelegível a todos:  a saída em massa de recursos neste montante impede que o Fundo cumpra sua missão social de financiar habitação.

É bom a gente lembrar o que aconteceu com as distorções geradas pelo fato dos recursos do falecido BNH – que geria os recursos do FGTS – irem financiar imóveis de luxo.

E não há nenhuma crise na procura por imóveis de valor mais elevados, como registrou o Valor Econômico:

O interesse é tão grande por apartamentos de alto padrão na zona sul (do Rio de Janeiro), especialmente em prédios de frente para o mar, que as construtoras nem montam mais estandes de venda nos prédios em lançamento. Os apartamentos são oferecidos por telemarketing ou simplesmente por e-mails enviados a clientes que já demonstraram interesse e estão na fila de espera. A demanda por escritórios e outros imóveis comerciais também está superaquecida.

E mesmo as pessoas que compram imóveis acima deste valor devem lembrar que a disponibilização do FGTS sem limites razoáveis ajuda e estimula a majoração dos preços dos imóveis, que já subiram vertiginosamente.

O que nós precisamos é aumentar a oferta de imóveis, para fazer com que os preços não disparem. Claro que, nisso, o essencial é aumentar a oferta. Mas é o caso de pensar em medidas complementares. Uma delas, por exemplo, é restabelecer, até um patamar razoável, o abatimento das despesas de aluguel no Imposto de Renda.

Explico: como não podem abater, milhões de inquilinos não declaram o aluguel que pagam. Em consequencia, centenas de milhares de proprietários não declaram o aluguel que recebem. E esse aluguel é renda. Afinal, se salário é considerado renda, aluguel não seria? E isso poderia ser feito com progressividade: não se trataria, do ponto de vista fiscal, da mesma forma quem tem a renda de um ou dois aluguéis do que se cuidaria daqueles que têm dez, vinte, alguns até centenas de imóveis locados, cujo aluguel e, por vezes, nem mesmo a propriedade é declarada ou assumida.

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Bendito livro…

Posted by Liberdade Aqui! em 22/05/2011

Por Miguel do Rosário, em seu blog

O livro “maldito”

“Não tenho sabença,
pois nunca estudei,
apenas eu sei
o meu nome assiná.
Meu pai, coitadinho,
vivia sem cobre
e o fio do pobre
não pode estudá”
(Patativa do Assaré)

Li o capítulo do livro amaldiçoado pela mídia e por todos que tropeçaram na pegadinha.

Merval Pereira afirma hoje em sua coluna que o livro irá prejudicar a produtividade da economia brasileira!

Esse escândalo, obviamente, tem o objetivo de horrorizar setores da classe média, que até hoje se recuperam do trauma de ter um presidente da república que não falava segundo a “norma culta” da língua.

É interessante como há segmentos da sociedade vulneráveis ao discurso da mídia. A procuradora federal Janice Ascari, provocada pelos jornalistas do Globo, interpretou o fato não como algo que merecia ser debatido pela sociedade e pelos especialistas (o livro foi indicado e aprovado por uma comissão de notáveis acadêmicos), mas como um caso de polícia! E ameaçou acionar o Ministério Público! Mereceu, como era de se esperar, uma grande homenagem do pasquim kamelista, uma foto gigante na página 3, em seu melhor ângulo fotogênico.

Ora, o que Janice Ascari entende de pedagogia, linguística, ensino de português? Com que poder ela vem ameaçar uma comissão de acadêmicos que estuda o tema há décadas, uma autora que foi professora da rede estadual por mais tempo que ela tem de vida, e um ministério cujos funcionários estudam o assunto sistematicamente, frequentando periodicamente seminários aqui e no exterior?

O livro não ensina o adolescente a falar errado! Ao contrário, é uma abordagem inteligente para mostrar ao estudante que a língua que aprendeu de seus pais pobres, e que foi a única que ouviu em toda parte antes de entrar na escola, não é para se jogar no lixo. É uma língua viva, popular, mas que também tem regras. Com isso, evita-se que o estudante despreze o seu próprio patrimônio linguístico. No Nordeste, temos centenas de poetas de grande talento que produzem literatura de incrível beleza usando a vertente “popular” da língua. É “errado” o que eles fazem? A poesia de Patativa do Assaré e de Luiz Gonzaga estão cheias de desvios da norma culta. Estão “erradas”?

O escândalo da mídia nada mais é do que explorar o preconceito da classe média, emergente ou tradicional, em relação à sintaxe popular.

Leiam o livro! Ele não ensina o estudante a falar errado. Ele não contemporiza. Trata-se simplesmente de uma interpretação carinhosa, pedagógica, acerca do uso popular da fala. É importantíssimo fazer isso!

Saliente-se que os livros didáticos de português há anos, desde o tempo de FHC, tem capítulos dedicados à fala popular, mais ou menos nos mesmos termos. Não se trata, portanto, de uma nova ideologia do “governo do PT”, como sugerem neo-sabichões que dão a tudo um viés partidário.

Só agora, por um oportunismo barato (com fins políticos), a mídia resolveu escandalizar.

O professor precisa dar uma explicação ao jovem porque o povo fala de um jeito “diferente”, e seria uma péssima didática se ele se restringisse a dizer que o povo fala “errado”. Não é isso que aprendemos na faculdade de letras, quando aprendemos linguística! Na faculdade, aprendemos justamente isso, que não existe o falar “errado”. Aliás, em linguística se vai ainda mais longe: afirma-se que sequer há uma gramática “certa” ou “errada”, e sim uma gramática “normativa”, ou seja, voltada para o aprendizado da língua escrita. Se um estudante universitário, que em tese já superou eventuais traumas decorrentes do uso, por seus pais e amigos, de uso de um português “popular”, “não-culto”, aprende que não existe falar “errado”, porque cargas d’água seria certo traumatizar o adolescente dizendo a ele que tudo que ele aprendeu de seus pais e ambiente é “errado”?

Na verdade, existe sim um falar “errado” em linguística. É a fala que não atinge seu objetivo, que não consegue se fazer entender, não consegue estabelecer a comunicação. Esse é único erro, o erro fundamental, de uma fala: não se comunicar, confundir.

Repito, leiam o livro e confiram. Não se ensina a falar errado. Apenas se procura incorporar, ao ensino do português, o uso popular da língua. É uma maneira inteligente de interessar o jovem, de atingir positivamente a sua auto-estima.

O livro mostra que mesmo o uso “popular” da língua segue regras sintáticas similares à da norma culta. Em geral, o uso popular simplifica a língua. “Os peixe”, por exemplo. A norma culta comete a redundância de repetir o plural. A norma popular entende que basta apontar o plural no artigo. Essa é a evolução da língua.

Naturalmente, temos aqui uma luta constante entre as tradições, cujos interesses são representados por instituições como a Academia Brasileira de Letras, e a evolução do idioma, que não pára. O objetivo do livro, e de todos os linguistas, não é soltar as rédeas do ensino da língua. É importante que tenhamos máxima uniformidade linguística. Que haja um ensino rigoroso do português normativo. Que todos os brasileiros dominem o português com máxima perfeição.

A evolução da língua acontece ao longo dos séculos, temperada no fogo desta luta entra a tradição e a força popular.

Para ensinar um jovem a falar o português culto, porém, em primeiro lugar temos que lhes mostrar que a língua segue uma lógica. As normas sintáticas têm uma lógica. O livro mostra que mesmo o português “popular” falado nas ruas também pode ser sistematizado sintaticamente. E que ele não é exatamente “errado”. Ele é, sim, inadequado. O livro enfatiza a necessidade de usarmos a norma culta para nos dirigirmos a uma autoridade, como, por exemplo, numa entrevista de emprego. Isso é o suficiente para dar a entender ao jovem, com a delicadeza que o tema merece, que ele tem de aprender a falar de forma o mais culta possível, para que suas chances profissionais sejam as maiores possíveis!

Ao mesmo tempo, o livro mostra ao estudante que ele não deve deixar de respeitar e estimar seus pais apenas porque estes usam o português de forma “não culta”, além de sinalizar que ele (o estudante) não deve sair por aí corrigindo, esnobando e depreciando as pessoas que não usam a norma culta da língua. Muitas vezes, um parente mais velho do aluno, um avô ou avó, detêm conhecimentos morais que serão muito importantes para o desenvolvimento da personalidade daquele adolescente. Ele não deverá desprezá-los apenas porque o avô não usa a norma “culta” da língua. Se o professor souber aplicar eficazmente o que ensina o livro em questão, o aluno compreenderá que seus parentes usam uma “vertente” popular da língua, mas que isso não invalida a legimitidade de seu discuso e de seus ensinamentos. Ao mesmo tempo, o aluno entenderá que precisa aprender a norma culta para arranjar um bom emprego e para ascencer socialmente. Está tudo ali no livro, muito bem explicadinho.

Claro que o livro não é perfeito. Os especialistas já encontraram erros até na obra de Cervantes. A autora pode modificar alguma coisa na edição do ano que vem. Ou não. O que é injusto é dizer que o livro ensina o jovem a falar errado, ou então afirmar, como fez Janice Ascari (que eu tantas vezes chamei brincando de “heroína” da blogosfera, mas que também, como qualquer um de nós, é sujeita a erros) que se trata de “um crime contra nossos jovens”. Crime, a meu ver, é desrespeitar a classe científica que estuda o assunto, e que aprovou esse livro, e tratar o tema como um caso de polícia e não como um tema importante a ser debatido, tranquila e democraticamente, pela sociedade brasileira!

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As manifestações sutis de discriminação racial estão cada vez mais presentes no dia-a-dia da sociedade brasileira

Posted by Liberdade Aqui! em 19/02/2011

Via Portal Luis Nassif

Preconceito sutil é mais forte e perpetua racismo

Cartum de Maurício Pestana

 

Enviado por luisnassif, sab, 19/02/2011 | Autor:  | Por lmstefanini

Retirado do site da Agência USP de Notícias

As manifestações sutis de discriminação racial estão cada vez mais presentes no dia-a-dia da sociedade brasileira. Segundo a psicóloga Sylvia Nunes, que pesquisou sobre o preconceito sutil no Instituto de Psicologia da USP, as pessoas ainda precisam pensar e discutir o tema de forma mais eficaz, a fim de reconhecer o racismo. Como aponta o estudo, a discriminação, da maneira como vem sendo perpetuada, está cada vez mais “escondida”, porém, ainda existente e resistente, tornando a luta contra o preconceito racial mais difícil.

Buscando entender e detectar esse tipo de manifestação de racismo, Sylvia aplicou um questionário a 235 alunos universitários, no Brasil, e a 71 estudantes, na Espanha. Lá, as perguntas eram relacionadas à discriminação dos ciganos, chamados gitanos, enquanto no caso brasileiro, eram relacionadas a discriminação contra negros e mestiços.De acordo com o trabalho de Sylvia, já houve épocas em que a forma mais comum de racismo era a explícita, chamada pela autora de “preconceito flagrante”, uma maneira de discriminação que geralmente envolve violência, xingamentos, agressão física e verbal, e é de “fácil percepção” e até de “denúncia”. Enquanto isso, como aponta a psicóloga, o preconceito sutil é corriqueiro, e se utiliza, por exemplo, de brincadeiras, piadas, omissões, ausências e apelidos que parecem “inocentes”.

“No questionário existiam frases ou perguntas como ‘“Eu não gostaria que um negro suficientemente qualificado fosse escolhido para meu chefe”, ou então “com que frequencia você sente simpatia pelos negros?”, respectivamente relacionadas ao preconceito flagrante ou sutil. Em algumas questões, por exemplo, as opções de respostas eram “níveis de concordância ou discordância”, como em “discordo muito, discordo em parte, discordo um pouco, concordo um pouco, concordo em parte, concordo muito”. Para chegar às conclusões quantitativas do estudo, foram utilizadas provas estatísticas, baseadas em escalas de preconceito sutil e flagrante, dos teóricos Pettigrew e Meertens, aplicadas às respostas do questionário.

Segundo os resultados dessas provas, há maior facilidade dos espanhóis em declarar o racismo que os brasileiros. A partir das respostas, também foi possível constatar que há maior expressão de preconceito sutil do que flagrante, nos dois países. Outro dado interessante é que os homens se mostraram mais preconceituosos que as mulheres, tanto no Brasil quanto na Espanha.

Entrevistas
Após essa fase da pesquisa, a psicóloga sorteou 19 pessoas dentre as que haviam respondido ao questionário, sendo 15, brasileiras e 4, espanholas. Na opinião da autora, “de todas as etapas, a das entrevistas no Brasil foi a mais enriquecedora. Ao prestar atenção nos discursos, era evidente a sutileza do preconceito, e o quanto as pessoas quase sempre dizem que o racista não é ela própria, e sim o outro”, afirma a autora do trabalho.

Depois de feitas as entrevistas, Sylvia formulou “categorias de análise” para estudar o aspecto qualitativo do estudo. Ao todo, a psicóloga apontou seis categorias, que sistematizam o que foi encontrado e detectado nos discursos, como evidência do preconceito sutil. Por exemplo, na categoria “Brincadeiras racistas”, o estudo revela o quanto a sutileza racista conquista lugar no universo do lúdico, das brincadeiras e apelidos, onde tudo parece não ser tão real ou sério, apesar de serem, quando o tema é preconceito.

Já a categoria “O dedo apontado para o negro” é composta pelas falas daqueles que recorrem ao discurso de que, na verdade, quem é preconceituoso e não aceita a si próprio é o negro, ou seja, fala por meio da qual há a culpabilização da vítima. Segundo Sylvia, há também os discursos que se encaixam na categoria “Pseudoneutralidade”. “Esses são aqueles que se protegem, que se incomodam sim com o tema, mas não encaram, e tentam se dizer neutros, imparciais, como se as situações cotidianas que envolvem preconceito sutil fossem indiferentes”, explica a pesquisadora.

Além disso, a autora afirma o seguinte: “nas entrevistas, também levantei a questão das cotas e de outras ações afirmativas. Agrupei as falas relacionadas ao assunto categorizando-as como ‘Raça e classe’. Neste agrupamento de falas, todos os entrevistados se posicionaram contra as cotas sem mesmo saber realmente o que são e o que representam, como se essas medidas afirmativas fossem os racistas da história”, exemplifica a autora.

O último grupo formulado pela psicóloga chama-se “Admissão do próprio racismo”. Nele, estão contidas as únicas 2 falas nas quais foi assumida a existência do racismo. Segundo Sylvia, é nessa admissão que está a melhor maneira de lutar contra o preconceito sutil. “Quando admitimos e reconhecemos o quanto somos sim racistas, temos mais elementos para decidir, e para refletir sobre nós mesmos. Falar do assunto, mexer com o assunto, expor o tema e perceber o racismo é bom, e nos faz militantes de nós mesmos quando nos deparamos com qualquer situação de descriminação”, conclui a autora.

 

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Da série Por Que a Elite Odeia Lula

Posted by Liberdade Aqui! em 06/02/2011

Por Eduardo Guimarães, em seu blog

A era Lula e o emprego doméstico no Brasil

 

Da série Por Que a Elite Odeia Lula, este post aborda um dos capítulos mais comoventes de uma epopéia que, três décadas após seu início, ainda mostra sinais de fôlego. Trata-se da libertação dos escravos domésticos que teve lugar no Brasil durante o primeiro governo popular pós-redemocratização.

Vai terminando, neste país, a escravização de mulheres pobres e, quase sempre, negras, jovens e nordestinas por famílias brancas, de classe média e do Sul-Sudeste, que, sem dinheiro ou vontade para pagar salários dignos e cumprir a legislação trabalhista, conseguiram do Estado brasileiro, eternamente a serviço das elites, permissão para escravizar seres humanos.

Essa afronta aos direitos fundamentais do homem permeou o século XX e começou a se extinguir, no Brasil, na primeira década do século XXI. As garotas que se dispunham a trabalhar da hora em que despertavam até a hora de irem dormir, que era a hora em que os patrões faziam o mesmo, não mais se submetem, como ocorre em qualquer país civilizado.

Matérias do jornal Folha de São Paulo deste domingo deixam ver os dois lados da moeda, das oprimidas e dos opressores.

Pelo lado das oprimidas, reportagem sobre como está escasseando, no Sul-Sudeste maravilha, a mão de obra doméstica, de como os salários subiram e de como estão terminando jornadas de trabalho de 24 horas com folga a cada 15 dias.

Pelo lado opressor, crônica da socialite Danusa Leão, com aquele velho trololó de toda dondoca de São Paulo e do Rio sobre como as “madames” são “humanas” com as “suas” domésticas e de como recebem “ingratidão” em troco.

A madame à qual o jornal paulista dá grande espaço, aos domingos, para verter preconceitos políticos e sociais, escreveu, desta vez, um texto criminoso estereotipando toda uma categoria e vendendo a tese de que não se deve “dar moleza a essa gentinha”.

Abaixo, primeiro a boa notícia sobre o fim da moleza de gente como Danusa Leão… De quem reproduzo a diarréia intelectual logo em seguida.

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Achar doméstica vira desafio na metrópole

Famílias antes acostumadas a contar com serviços dentro de casa têm de adaptar hábitos ou pagar salários melhores

Brasil tende a seguir caminho dos países desenvolvidos, onde contratar empregadas é luxo, diz especialista

CRISTINA MORENO DE CASTRO
FOLHA DE SÃO PAULO

6 de fevereiro de 2011

Há 15 anos, bastava um anúncio de três linhas no jornal para atrair 200 candidatas a um emprego doméstico numa segunda de manhã.

Hoje, com ofertas também via SMS e internet, menos de 30 candidatas por dia vão às agências atrás de uma vaga, dizem profissionais de recrutamento ouvidos pela Folha.

O resultado da conta é que os salários subiram e está cada dia mais difícil de encontrar mão de obra disponível.

A diretora de RH Cinthia Bossi, 39, abriu mão de contar com alguém que dormisse em casa ou trabalhasse nos finais de semana. Chegou a trocar de empregadas seis vezes em cinco meses e vai ter que trocar pela segunda vez neste mês. Nos últimos três anos, o salário que paga subiu de R$ 600 para R$ 1.000.

Ela não é exceção. As donas de casa estão tendo que abrir mão de antigas “mordomias”, como ter uma auxiliar 24 horas por dia, com folgas quinzenais. “Já tenho amigas que abrem mão de alguém que cozinhe e colocam as crianças na escola mais cedo. Se querem a empregada no sábado, pagam hora extra.”

A técnica em alimentos Kátia Ramos, 34, também desistiu de ter alguém que durma em sua casa. Chegou a passar um mês sem empregada e babá -com quadrigêmeos de 1 ano e 11 meses e dois filhos adolescentes.

Ela cogita cortar de vez a despesa com o auxílio doméstico quando os filhos crescerem. Hoje, já ajuda nas tarefas da babá e cozinha.

Especialistas ouvidos pela Folha traçaram o seguinte panorama: mais mulheres entraram no mercado de trabalho, precisando cada vez mais de empregadas para cuidar de casa. Ao mesmo tempo, o aumento das oportunidades de trabalho e de educação fez com que menos pessoas quisessem seguir o trabalho doméstico, ainda muito discriminado, inclusive pela legislação do país.

“Estamos em um período de transição”, afirma Eduardo Cabral, sócio da empresa de RH Primore Valor Humano. “Talvez a próxima geração valorize mais a doméstica porque estão ouvindo mais os pais falando dessa dificuldade de encontrá-las.”

Para a pesquisadora do Insper Regina Madalozzo, esse período de transição, até haver uma real valorização do trabalho doméstico, ainda vai durar uns 20 anos.

Mas a curto prazo, diz ela, a relação entre patrão e empregado vai mudar, passando a ser mais profissional.

“A tendência é que se torne um luxo, ao menos nos grandes centros”, afirma Cássio Casagrande, procurador do Ministério Público do Trabalho e professor de direito constitucional da Universidade Federal Fluminense.

A experiência de Michelle Almeida, 29, é ilustrativa. Ela começou como babá em 2003, ganhando R$ 350 mensais e dormindo na casa dos patrões. Agora em seu terceiro emprego, após dois cursos de capacitação como babá, ganha R$ 1.300, de segunda a sábado, das 8h às 18h.

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Luta de classes

“Aprendi que a luta de classes começa dentro de casa, e mais especificamente, dentro da geladeira”

DANUZA LEÃO

FOLHA DE SÃO PAULO

6 de fevereiro de 2011

HÁ UNS DOIS ANOS tive uma diarista que começava a trabalhar muito cedo -por escolha dela; às 6h ela já estava em minha casa. Uma morenona bem carioca, simpática, risonha, disposta, sempre de altíssimo astral. Gostei dela, e como detesto fazer ares de patroa – e não sei –, tínhamos uma relação amistosa e legal, como devem ser todas as relações.

Algum tempo depois, comecei a fazer aula de natação em um clube que fica a uns 500 metros de minha casa. A aula era às 7h, mas e a preguiça? Preguiça de levantar da cama, e enfrentar a distância ficou difícil. Tive então uma ideia: levá-la comigo. Assim, teria companhia para ir e voltar, e seria mais fácil a caminhada.

Vamos deixar bem claro: não foi nem um ato de gentileza de minha parte, nem pensei apenas em meu proveito.Achei que seria bom para as duas, e ela, que talvez nunca tivesse entrado numa piscina, ia adorar.

Perguntei se gostaria, ela ficou toda feliz, e, a partir daí, todos os dias íamos juntas, conversando.
Eu pagava minha aula e a dela, e às 8h30 estávamos de volta, alegres, falando sobre nossos progressos.

Já que não posso mudar o mundo, pensei, estou exercendo o socialismo -ou a democracia- pelo menos em meu território. Mas notei que a cada vez que contava isso para os amigos, nenhum deles dizia uma só palavra; nem para achar que tinha sido uma boa solução, nem para ficar contra, nem ao menos para achar alguma graça. Silêncio geral e total.

O tempo foi passando. Comecei a perceber pequenos desvios no troco, às vezes dava por falta de uma das três mangas compradas na feira, os picolés que guardava no freezer desapareciam, os refrigerantes e sabonetes também, e eu pensava: “tem dó, Danuza, afinal ela toma duas conduções para vir, duas para voltar, a grana é pouca, se ela fica com oito ou dez reais da feira, é distribuição de renda. E se comeu metade do Gruyère, dizer que o queijo francês é só seu, é um horror”; e assim fomos indo.

Fomos indo até que um dia viajei por um mês, e quando voltei, houve problema com um cheque; coisa pouca, mas ficou claro, claríssimo, que tinha sido ela, e tive que demiti-la, o que aliás me custou bem caro, em dinheiro e pela deslealdade.

Depois da demissão, fui descobrindo coisas mais graves -e nem vou contar todas, só uma delas: nos fins de semana, ela vinha com o marido, punha o carro na garagem do prédio e o casal passava o fim de semana na minha casa.

Depois de recibos assinados, tudo liquidado, chegou a conta do telefone do mês em que estive fora: havia 68 ligações para um único celular. Liguei para o número e soube que era de um funcionário do clube de natação, que ela paquerava.

Quando entrou a substituta, tive que comprar lençóis, toalhas e um monte de coisas que ela havia levado. Sei que não sou um modelo de dona de casa, mas alguém conta todos os dias quantos lençóis tem? E tranca os armários? Não eu. Durante um bom tempo fiquei mal: pela confiança, pela traição, depois de quase dois anos de convivência. E agora?

Não sei. Afinal, somos ou não somos todos seres humanos iguais, como me ensinaram? Ou é preciso mesmo existir uma distância empregado/patrão, como dizem outros? Ou esse foi um caso singular?

Aprendi que a luta de classes começa dentro de nossa casa, e mais especificamente, dentro da geladeira. E enquanto o mundo não muda, passei a comprar queijo de Minas, que além de tudo não engorda.

 

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Educação brasileira e o mito coreano

Posted by Liberdade Aqui! em 28/12/2010

Via Blog do Favre

O mito coreano

VLADIMIR SAFATLE – FOLHA SP

Virou lugar-comum usar a Coreia do Sul como modelo de desenvolvimento educacional. Quando o assunto é educação, sempre há alguém a louvar o pretenso sucesso das políticas coreanas e a se perguntar, indignado, por que o Brasil é incapaz de seguir os passos daquele país.
No fundo, a comparação serve para mostrar o que certos setores da sociedade civil entendem por “educação”.

Longe de terem visão inovadora, como propagam, tais setores apenas buscam fornecer nova roupagem a velhos dogmas da educação nacional.
No começo da formação efetiva do Estado nacional brasileiro, nos anos 30, um dos eixos das discussões educacionais girava em torno da necessidade de políticas maciças de “formação para o trabalho”.

Partia-se da ideia de que o país deveria ter uma grande base de formação técnica especializada para fornecer mão de obra qualificada e prometer sólida empregabilidade a classes desfavorecidas. Por outro lado, bolsões de formação “humanista” seriam criados para uma elite que teria como função a reprodução de si mesma. Este sistema de duas velocidades era abertamente defendido pela intelectualidade que ocupava a imprensa, como Monteiro Lobato e Anísio Teixeira, entre outros.

Mas tais bolsões acabaram por produzir o pensamento crítico que iria, em larga medida, desconstruir a visão que as elites tinham do país, assim como mostrar sua incapacidade de construir um projeto nacional inclusivo. Esta formação não servia para os propósitos iniciais. Melhor seria mandar os filhos abastados estudarem economia financeira no exterior.

Sobrou martelar a ideia de que o Brasil deve reconstruir seu modelo privilegiando a antiga “formação para o trabalho”, proliferando escolas técnicas e reduzindo o espectro de suas pesquisas universitárias aos interesses imediatos dos grupos econômicos hegemônicos. Neste contexto, aparece o mito coreano como promessa redentora.

De fato, para alguns, seria ótimo imitar o modelo de um país que, no fundo, nem sequer conhece o que é pesquisa em ciências humanas e não tem sequer uma universidade como polo real de influência em várias áreas do saber. Pois tais pessoas não acreditam que “educação” seja o nome que damos para um processo de formação do pensamento crítico, de desenvolvimento da criatividade e da força de mudança, de consolidação da capacidade de se indignar moralmente, de refletir sobre a vida social e de compreender reflexivamente as múltiplas tradições que nos geraram.

Para elas, “educação” é só o nome que damos ao processo de formação de mão de obra para empregos precários e mal pagos. Mesmo do ponto de vista do desenvolvimento social, tal escolha é catastrófica.


VLADIMIR SAFATLE escreve às terças-feiras nesta coluna.

 

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“Amado pelo povo, detestado pela mídia”

Posted by Liberdade Aqui! em 22/12/2010

Via Terror do Nordeste

Venício Lima: Revisitando o poder da mídia

O fenômeno Lula, que deixa o poder, como observou um analista, “amado pelo povo e detestado pela mídia”, deve servir não só para uma reavaliação do papel da mídia, mas também como horizonte para aqueles que trabalham pela universalização da liberdade de expressão e pela efetivação do direito à comunicação.

Por Venício Lima*, em Carta Maior

Os resultados da pesquisa CNI/Ibope divulgados no dia 16 de dezembro confirmam uma clara tendência dos últimos anos e, ao mesmo tempo, recolocam uma importante questão sobre o poder da grande mídia tradicional. De fato, a aprovação pessoal e a confiança no presidente Lula atingiram novos recordes, 87% e 81%, respectivamente; e a avaliação positiva do governo subiu para 80%, outro recorde .

A confirmação dessa tendência ocorre apesar da grande mídia e sua cobertura política do presidente e de seu governo ter sido, ao longo dos dois mandatos, claramente hostil ou, como disse a presidente da ANJ, desempenhando o papel de oposição partidária.

Isso significa que a grande mídia perdeu o seu poder?

Monopólio da informação política

Parece não haver dúvida de que a mídia tradicional não tem mais hoje o poder de “formação de opinião” que teve no passado em relação à imensa maioria da população brasileira. E por que não?

Um texto clássico dos estudos da comunicação, escrito por dois fundadores deste campo, ainda na metade do século passado, afirmava que para os meios de comunicação exercerem influência efetiva sobre os seus públicos é necessário que se cumpram pelo menos uma das seguintes três condições, válidas até hoje: monopolização; canalização ao invés de mudança de valores básicos, e contato pessoal suplementar. Com relação à monopolização afirmam:

“Esta situação se concretiza quando não se manifesta qualquer oposição crítica na esfera dos meios de comunicação no que concerne à difusão de valores, políticas ou imagens públicas. Vale dizer que a monopolização desses meios ocorre na falta de uma contrapropaganda. Neste sentido restrito, essa monopolização pode ser encontrada em diversas circunstâncias. É claro, trata-se de uma característica da estrutura política de uma sociedade autoritária, onde o acesso a esses meios encontra-se totalmente bloqueado aos que se opõem à ideologia oficial” [cf. Paul Lazarsfeld e Robert K. Merton, “Comunicação de massa, gosto popular e ação social organizada” in G. Cohn, org. Comunicação e Indústria Cultural; CEN; 1ª. ed., 1971; pp. 230-253].

Aparentemente, a monopolização do discurso político “mediado” pela grande mídia – em regimes não-autoritários – foi quebrada pelo enorme aumento das fontes de informação, sobretudo com a incrível disseminação e capilaridade social da internet.

Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, quando de sua rápida visita ao Brasil, em abril passado, o fundador do diário espanhol El País, Juan Luis Cebrian, afirmava:

“…a internet é um fenômeno de desintermediação. E que futuro aguarda os meios de comunicação, assim como os partidos políticos e os sindicatos, num mundo desintermediado? Do início ao fim da última campanha presidencial americana, circularam pela web algo como 180 milhões de vídeos sobre os candidatos Obama e McCain, mas apenas 20 milhões haviam saído dos partidos Democrata e Republicano. As próprias organizações políticas foram ultrapassadas pela movimentação dos cidadãos. Como ordenar tudo isso? Não sei. (…) …hoje existem 2 bilhões de internautas no mundo, ou seja, um terço da população planetária já tem acesso à rede. Há 200 milhões de páginas web à escolha do navegante. Na rede, você diz o que quer, quando quiser e a quem ouvir, portanto, o acesso à informação aumentou de forma espetacular. Isso é fato [íntegra disponível aqui].

A disseminação da internet – ou seja, a quebra do monopólio informativo da grande mídia – aliada a mudanças importantes em relação à escolaridade e à redistribuição de renda que atingem boa parte da população brasileira, certamente ajudam a compreender os incríveis índices de aprovação de Lula e de seu governo, mesmo enfrentando a “oposição” da grande mídia.

Resta muito poder

Isso não significa, todavia, que a grande mídia tenha perdido todo o seu poder. Ao contrário, ela continua poderosa, por exemplo, na construção da agenda pública e na temerosa substituição de várias funções tradicionais dos partidos políticos, vale dizer, do enfraquecimento deles.

A grande mídia, em particular a mídia impressa (jornais e revistas), ainda continua poderosa como ator político em relação à reduzida parcela da população que se situa na ponta da pirâmide social e exerce influência significativa nas esferas do poder responsáveis pela formulação das políticas públicas, inclusive no setor das comunicações.

O fenômeno Lula, que deixa o poder, como observou um analista, “amado pelo povo e detestado pela mídia”, deve servir, não só para uma reavaliação do papel da mídia de massa tradicional, mas também como horizonte para aqueles que trabalham pela universalização da liberdade de expressão e pela efetivação do direito à comunicação.

*Venício A. de Lima é professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010.

 

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De onde virá a luz…?

Posted by Liberdade Aqui! em 06/12/2010

Via blog do Escrevinhador

“Liberdade de expressão” para quem?

publicada segunda-feira, 06/12/2010

Liberdade de expressão: uma armadilha para pegar quem?

Por Elaine Tavares, no site da Caros Amigos

O velho Marx já ensinou há muitos anos sobre o que é a ideologia. É o encobrimento da verdade. Assim, tudo aquilo que esconde, vela, obscurece, tapa, encobre, engana, é ideologia. É dentro deste espectro que podemos colocar o debate que se faz hoje no Brasil, na Venezuela, no Equador e na Bolívia sobre o binômio “liberdade de expressão X censura”. Para discutir esse tema é preciso antes de mais nada observar de onde partem os gritos de “censura, censura”, porque na sociedade capitalista toda e qualquer questão precisa ser analisada sob o aspecto de classe.  A tal da “democracia”, tão bendita por toda a gente, precisa ela mesma de um adjetivo, como bem já ensinou Lênin. “Democracia para quem? Para que classe?”.

Na Venezuela a questão da liberdade de expressão entrou com mais força no imaginário das gentes quando o governo decidiu cassar a outorga de uma emissora de televisão, a RCTV, por esta se negar terminantemente a cumprir a lei, discutida e votada democraticamente pela população e pela Assembléia Nacional. “Censura, cerceamento da liberdade de expressão” foram os conceitos usados pelos donos da emissora para “denunciar” a ação governamental. Os empresários eram entrevistados pela CNN e suas emissoras amigas, de toda América Latina, iam reproduzindo a fala dos poderosos donos da RCTV. Transformados em vítimas da censura, eles foram inclusive convidados para palestras e outros quetais aqui nas terras tupiniquins.

Lá na Venezuela os organismos de classe dos jornalistas, totalmente submetidos à razão empresarial, também gritavam “censura, censura” e faziam coro com as entidades de donos de empresas de comunicação internacionais sobre o “absurdo” de haver um governo que fazia cumprir a lei. Claro que pouquíssimos jornais e jornalistas conseguiram passar a informação correta sobre o caso, explicando a lei, e mostrando que os que se faziam de vítima, na verdade eram os que burlavam as regras e não respeitavam a vontade popular e política. Ou seja, os arautos da “democracia liberal” não queriam respeitar as instituições da sua democracia.  O que significa que quando a democracia que eles desenham se volta contra eles, já não é mais democracia. Aí é ditadura e cerceamento da liberdade de expressão.

No Brasil, a questão da censura voltou à baila agora com o debate sobre os Conselhos de Comunicação. Mesma coisa. A “democracia liberal” consente que existam conselhos de saúde, de educação, de segurança, etc… Mas, de comunicação não pode. Por quê? Porque cerceia a liberdade de expressão. Cabe perguntar. De quem?  Os grandes meios de comunicação comercial no Brasil praticam a censura, todos os dias, sistematicamente. Eles escondem os fatos relacionados a movimentos sociais, lutas populares, povos indígenas, enfim, as maiorias exploradas. Estas só aparecem nas páginas dos jornais ou na TV na seção de polícia ou quando são vítimas de alguma tragédia. No demais são esquecidas, escondidas, impedidas de dizerem a sua palavra criadora. E quando a sociedade organizada quer discutir sobre o que sai na TV, que é uma concessão pública, aí essa atitude “absurda” vira um grande risco de censura e de acabar com a liberdade de expressão. Bueno, ao povo que não consegue se informar pelos meios, porque estes censuram as visões diferentes das suas, basta observar quem está falando, quem é contra os conselhos. De que classe eles são. Do grupo dos dominantes, ou dos dominados?

Agora, na Bolívia, ocorre a mesma coisa com relação à recém aprovada lei anti-racista. Basta uma olhada rápida nos grandes jornais de La Paz e lá está a elite branca a gritar: “censura, censura”. A Sociedade Interamericana de Imprensa, que representa os empresários, fala em cerceamento da liberdade de expressão.   Os grêmios de jornalistas, também alinhados com os patrões falam a mesma coisa, assim como as entidades que representam o poder branco, colonial e racista. Estes mesmos atores sociais que ao longo de 500 anos censuraram a voz e a realidade indígena e negra nos seus veículos de comunicação, agora vem falar de censura. E clamam contra suas próprias instituições. A lei anti-racista prevê que os meios de comunicação que incentivarem pensamentos  e ações racistas poderão ser multados ou fechados. Onde está o “absurdo” aí? Qual é o cerceamento da liberdade de expressão se a própria idéia de liberdade, tão cara aos liberais, se remete à máxima: “a minha liberdade vai até onde começa a do outro”? Então, como podem achar que é cerceamento da liberdade de expressão usar do famoso “contrato social” que garante respeito às diferenças?

Ora, toda essa gritaria dos grandes empresários da comunicação e seus capachos nada mais é do que o profundo medo que todos têm da opinião pública esclarecida. Eles querem o direito de continuar a vomitar ideologia nos seus veículos, escondendo a voz das maiorias, obscurecendo a realidade, tapando a verdade. Eles querem ter o exclusivo direito de decidir quem aparece na televisão e qual o discurso é válido. Eles querem manter intacto seu poder escravista, racista e colonial que continua se expressando como se não tivessem passado 500 anos e a democracia avançado nas suas adjetivações. Hoje, na América Latina, já não há apenas a democracia liberal, há a democracia participativa, protagônica, o nacionalismo popular. As coisas estão mudando e as elites necrosadas se recusam a ver.

O racismo é construção de quem domina

Discursos como esses, das elites latino-americanas e seus capachos, podem muito bem ser explicados pela história. Os componentes de racismo, discriminação e medo da opinião pública esclarecida têm suas raízes na dominação de classe. Para pensar essa nossa América Latina um bom trabalho é o do escritor Eric Williams, nascido e criado na ilha caribenha de Trinidad Tobago, epicentro da escravidão desde a invasão destas terras orientais pelos europeus. No seu livro Capitalismo e Escravidão, ele mostra claramente que o processo de escravidão não esteve restrito apenas ao negro. Tão logo os europeus chegaram ao que chamaram de Índias Orientais, os primeiros braços que trataram de escravizar foram os dos índios.

Os europeus buscavam as Índias e encontraram uma terra nova. Não entendiam a língua, não queriam saber de colonização. Tudo o que buscavam era o ouro. Foi fácil então usar da legitimação filosófica do velho conceito grego que ensinava ser apenas “o igual”, “o mesmo”, aquele que devia ser respeitado. Se a gente originária não era igual à européia, logo, não tinha alma, era uma coisa, e podia ser usada como mão de obra escrava para encontrar as riquezas com as quais sonhavam. Simples assim. Essa foi a ideologia que comandou a invasão e seguiu se sustentando ao longo destes 500 anos. Por isso é tão difícil ao branco boliviano aceitar que os povos originários possam ter direitos. Daí essa perplexidade diante do fato de que, agora, por conta de uma lei, eles não poderão mais expressar sua ideologia racista, que nada mais fez e ainda faz, que sustentar um sistema de produção baseado na exploração daquele que não é igual.

Eric Williams vai contar ainda como a Inglaterra construiu sua riqueza a partir do tráfico de gente branca e negra, para as novas terras, a serem usadas como braço forte na produção do açúcar, do tabaco, do algodão e do café. Como o índio não se prestou ao jogo da escravidão, lutando, fugindo, morrendo por conta das doenças e até se matando, o sistema capitalista emergente precisava inventar uma saída para a exploração da vastidão que havia encontrado. A escravidão foi uma instituição econômica criada para produzir a riqueza da Inglaterra e, de quebra, dos demais países coloniais. Só ela seria capaz de dar conta da produção em grande escala, em grandes extensões de terra. Não estava em questão se o negro era inferior ou superior. Eram braços, e não eram iguais, logo, passíveis de dominação. Eles foram roubados da África para trabalhar a terra roubada dos originários de Abya Yala.

Também os brancos pobres dos países europeus vieram para as Américas como servos sob contrato, o que era, na prática, escravidão. Segundo Williams, de 1654 a 1685, mais de 10 mil pessoas nestas condições partiram somente da cidade de Bristol, na Inglaterra, para servir a algum senhor no Caribe. Conta ainda que na civilizada terra dos lordes também eram comuns os raptos de mulheres, crianças e jovens, depois vendidos como servos. Uma fonte segura de dinheiro. De qualquer forma, estas ações não davam conta do trabalho gigantesco que estava por ser feito no novo mundo, e é aí que entra a África. Para os negociantes de gente, a África era terra sem lei e lá haveria de ter milhões de braços para serem roubados sem que alguém se importasse. E assim foi. Milhões vieram para a América Latina e foram esses, juntamente com os índios e os brancos pobres, que ergueram o modo de produção capitalista, garantiram a acumulação do capital e produziram a riqueza dos que hoje são chamados de “países ricos”.

E justamente porque essa gente foi a responsável pela acumulação de riqueza de alguns que era preciso consolidar uma ideologia de discriminação, para que se mantivesse sob controle a dominação. Daí o discurso – sistematicamente repetido na escola, na família, nos meios de comunicação – de que o índio é preguiçoso, o negro é inferior e o pobre é incapaz. Assim, se isso começa a mudar, a elite opressora sabe que o seu mundo pode ruir.

Liberdade de expressão

É por conta da necessidade de manter forte a ideologia que garante a dominação que as elites latino-americanas tremem de medo quando a “liberdade de expressão” se volta contra elas. Esse conceito liberal só tem valor se for exercido pelos que mandam e aí voltamos àquilo que já escrevi lá em cima. Quando aqueles que os dominadores consideram “não-seres” –  os pobres, os negros, os índios – começam a se unir e a construir outro conceito de direito, de modo de organizar a vida, de comunicação, então se pode ouvir os gritos de “censura, censura, censura” e a ladainha do risco de se extinguir a liberdade de expressão.

O que precisa ficar bem claro a todas as gentes é de que está em andamento na América Latina uma transformação. Por aqui, os povos originários, os movimentos populares organizados, estão constituindo outras formas de viver, para além dos velhos conceitos europeus que dominaram as mentes até então. Depois de 500 anos amordaçados pela “censura” dos dominadores, os oprimidos começam a conhecer sua própria história, descobrir seus heróis, destapar sua caminhada de valentia e resistência. Nomes como Tupac Amaru, Juana Azurduy, Zumbi dos Palmares, Guaicapuru, Bartolina Sisa, Tupac Catari, Sepé Tiaraju, Dandara, Artigas, Chica Pelega, assomam, ocupam seu espaço no imaginário popular e provocam a mudança necessária.

Conceitos como Sumak kawsay, dos Quíchua equatorianos, ou o Teko Porã, dos Guarani,  traduzem um jeito de viver que é bem diferente do modo de produção capitalista baseado na exploração, na competição, no individualismo. O chamado “bem viver” pressupõe uma relação verdadeiramente harmônica e equilibrada com a natureza, está sustentado na cooperação e na proposta coletiva de organização da vida. Estes são conceitos poderosos e “perigosos”. Por isso, os meios de comunicação não podem ficar à mercê dos desejos populares. Essas idéias “perigosas” poderiam começar a aparecer num espaço onde elas estão terminantemente proibidas. É esse modo de pensar que tem sido sistematicamente censurado pelos meios de comunicação. Porque as elites sabem que destruída e ideologia da discriminação contra o diferente e esclarecida a opinião pública, o mundo que construíram pode começar a ruir. A verdadeira liberdade de expressão é coisa que precisa ficar bem escondida, por isso são tão altos os gritos que dizem que ela pode se acabar se as gentes começarem a “meter o bedelho” neste negócio que prospera há 500 anos.

Basta de bobagens

É neste contexto histórico, econômico e político que deveriam ser analisados os fatos que ocorrem hoje na Venezuela, no Equador, na Bolívia e na Argentina. O Brasil deveria, não copiar o que lá as gentes construíram na sua caminhada histórica, mas compreender e perceber que é possível estabelecer aqui também um processo de mudança.  Neste mês de novembro o Ministério das Comunicações chamou um seminário para discutir uma possível lei de regulamentação da mídia brasileira. Não foi sem razão que os convidados eram de Portugal, Espanha e Estados Unidos. Exemplos de um mundo distante, envelhecido, necrosado, representantes de um capitalismo moribundo. As revolucionárias, criativas e inovadoras contribuições dos países vizinhos não foram mencionadas. A Venezuela tem uma das leis mais interessantes de regulamentação da rádio e TV, a Argentina deu um passo adiante com a contribuição do movimento popular, a Bolívia avança contra o racismo, o Equador inova na sua Constituição, e por aqui tudo é silêncio. Censura?

Os governantes insistem em buscar luz onde reina a obscuridade. E, ainda assim pode-se ouvir o grito dos empresários a dizer: censura, censura, censura. O atraso brasileiro é tão grande que mesmo as liberais regulamentações européias são avançadas demais. Enquanto isso Abya Yala caminha, rasgando os véus…

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Posted by Liberdade Aqui! em 19/11/2010

Por Eduardo Guimarães, em seu blog

Por que cresce o ódio racial da elite branca

Apesar das negativas da grande imprensa, é inegável que nos últimos anos o Brasil começou a operar uma forte distribuição de renda de um grupo étnico minoritário e privilegiado para outro amplamente majoritário e eternamente prejudicado na divisão da riqueza.

Por estar a serviço do setor privilegiado – pois, em última instância, pertence a ele –, a mídia corporativa meramente canaliza um sentimento de “revolta” de classe e racial desses setores da sociedade que, até há pouco, vinham ganhando a luta de classes – que alguns tentam apresentar como anomalia ou desejo de grupos políticos, mas que, em um país tão injusto, é mera conseqüência de sua realidade social.

Estudo recente, pois, explica o ódio da elite branca contra um governo que desencadeou esse necessário processo redistribuidor de renda em prol da maioria étnica brasileira que sempre ostentou condições de vida infinitamente piores do que as de uma casta branca e descendente de europeus.

Data Popular é uma instituição que, segundo diz sua mensagem institucional, dedica-se a produzir “Conhecimento de qualidade sobre o mercado popular no Brasil”. Ao entrar no site, a mensagem institucional inicial esclarece a que ele se dedica:

Bem-vindo ao mundo do carnê, do consórcio, do SPC.

Bem-vindo ao mundo do metrô, do buzão, da lotação, da CBTU, do seminovo zerado.

Bem-vindo ao mundo do vale-refeição, do PF e da marmita.

Bem-vindo ao mundo do supletivo, da escola de cabeleireiro e do curso de computação.

Bem-vindo ao mundo do celular pré-pago, da megasena.

Bem-vindo ao mundo do trabalho informal, da pensão do INSS, do despertador pras 5,
da mobilidade social.

Bem-vindo ao mundo do Ratinho, Raul Gil, Bruno & Marrone, Banda Calypso, Calcinha Preta, MC Leozinho e da Rádio Tupi.

Bem-vindo ao mundo do supermercado com a família, da cervejinha gelada, da macarronada com frango, do financiamento da Caixa.

Bem-vindo ao mundo surpreendente da economia da base da pirâmide.

O trabalho mais recente do Data Popular, concluído nesta semana, busca prover com dados científicos o crescente interesse de grandes empresas por esse segmento em ascensão social, segmento no qual os negros sobressaem.

A renda da população negra no país atingiu R$ 544 bilhões. Segundo estudos recentes, desde 2007 a renda média per capita do negro cresceu 38% – o dobro da renda média do branco, que teve alta de 19% no mesmo período.

A última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), feita pelo IBGE, deixa ver claramente como durante o governo Lula essa parcela amplamente majoritária – e “afrodescendente” – da população brasileira começou a ser resgatada da injustiça social em que foi mantida durante o século XX.

Segundo Renato Meirelles, sócio-diretor do instituto de pesquisa Data Popular, o “enriquecimento” dos negros é resultado do aumento da renda da população da base da pirâmide de renda do país: “tem mais negros nas classes C e D, que teve aumento maior de renda que nas classes A e B [no período analisado]”.

Esse estudo não precisaria ter sido feito para que os beneficiados pelo processo redistribuidor  de renda percebessem-no.  Quem está comprando mais bens de consumo durável, vestuário, alimentos, ou que está chegando a universidades na condição de primeiro universitário da família, bem sabe o que lhe está acontecendo – e inclusive votou para manter esse processo.

Além de subsidiar empresas interessadas no mercado de consumo de massas que o governo do PT fez surgir, o estudo serve para finalmente calar os que tentam atribuir tal processo a governos que trataram de impedi-lo ou àqueles que tentam negar que tal processo esteja ocorrendo.

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Dois pesos… e a luta de classes

Posted by Liberdade Aqui! em 02/10/2010

Via blog do Escrevinhador

Dois pesos… Maria Rita Khel diz tudo!

publicada sábado, 02/10/2010

Reproduzo o belíssimo artigo de Maria Rita Khel, publicado hoje no Estadão.

DOIS PESOS…

Este jornal teve uma atitude que considero digna: explicitou aos leitores que apoia o candidato Serra na presente eleição. Fica assim mais honesta a discussão que se faz em suas páginas. O debate eleitoral que nos conduzirá às urnas amanhã está acirrado. Eleitores se declaram exaustos e desiludidos com o vale-tudo que marcou a disputa pela Presidência da República. As campanhas, transformadas em espetáculo televisivo, não convencem mais ninguém. Apesar disso, alguma coisa importante está em jogo este ano. Parece até que temos luta de classes no Brasil: esta que muitos acreditam ter sido soterrada pelos últimos tijolos do Muro de Berlim. Na TV a briga é maquiada, mas na internet o jogo é duro.

Se o povão das chamadas classes D e E – os que vivem nos grotões perdidos do interior do Brasil – tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos. O argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a favor da continuidade das políticas sociais implantadas durante oito anos de governo Lula não valem tanto quanto os nossos. Não são expressão consciente de vontade política. Teriam sido comprados ao preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola.

Uma dessas correntes chegou à minha caixa postal vinda de diversos destinatários. Reproduzia a denúncia feita por “uma prima” do autor, residente em Fortaleza. A denunciante, indignada com a indolência dos trabalhadores não qualificados de sua cidade, queixava-se de que ninguém mais queria ocupar a vaga de porteiro do prédio onde mora. Os candidatos naturais ao emprego preferiam viver na moleza, com o dinheiro da Bolsa-Família. Ora, essa. A que ponto chegamos. Não se fazem mais pés de chinelo como antigamente. Onde foram parar os verdadeiros humildes de quem o patronato cordial tanto gostava, capazes de trabalhar bem mais que as oito horas regulamentares por uma miséria? Sim, porque é curioso que ninguém tenha questionado o valor do salário oferecido pelo condomínio da capital cearense. A troca do emprego pela Bolsa-Família só seria vantajosa para os supostos espertalhões, preguiçosos e aproveitadores se o salário oferecido fosse inconstitucional: mais baixo do que metade do mínimo. R$ 200 é o valor máximo a que chega a soma de todos os benefícios do governo para quem tem mais de três filhos, com a condição de mantê-los na escola.

Outra denúncia indignada que corre pela internet é a de que na cidade do interior do Piauí onde vivem os parentes da empregada de algum paulistano, todos os moradores vivem do dinheiro dos programas do governo. Se for verdade, é estarrecedor imaginar do que viviam antes disso. Passava-se fome, na certa, como no assustador Garapa, filme de José Padilha. Passava-se fome todos os dias. Continuam pobres as famílias abaixo da classe C que hoje recebem a bolsa, somada ao dinheirinho de alguma aposentadoria. Só que agora comem. Alguns já conseguem até produzir e vender para outros que também começaram a comprar o que comer. O economista Paul Singer informa que, nas cidades pequenas, essa pouca entrada de dinheiro tem um efeito surpreendente sobre a economia local. A Bolsa-Família, acreditem se quiserem, proporciona as condições de consumo capazes de gerar empregos. O voto da turma da “esmolinha” é político e revela consciência de classe recém-adquirida.

O Brasil mudou nesse ponto. Mas ao contrário do que pensam os indignados da internet, mudou para melhor. Se até pouco tempo alguns empregadores costumavam contratar, por menos de um salário mínimo, pessoas sem alternativa de trabalho e sem consciência de seus direitos, hoje não é tão fácil encontrar quem aceite trabalhar nessas condições. Vale mais tentar a vida a partir da Bolsa-Família, que apesar de modesta, reduziu de 12% para 4,8% a faixa de população em estado de pobreza extrema. Será que o leitor paulistano tem ideia de quanto é preciso ser pobre, para sair dessa faixa por uma diferença de R$ 200? Quando o Estado começa a garantir alguns direitos mínimos à população, esta se politiza e passa a exigir que eles sejam cumpridos. Um amigo chamou esse efeito de “acumulação primitiva de democracia”.

Mas parece que o voto dessa gente ainda desperta o argumento de que os brasileiros, como na inesquecível observação de Pelé, não estão preparados para votar. Nem todos, é claro. Depois do segundo turno de 2006, o sociólogo Hélio Jaguaribe escreveu que os 60% de brasileiros que votaram em Lula teriam levado em conta apenas seus próprios interesses, enquanto os outros 40% de supostos eleitores instruídos pensavam nos interesses do País. Jaguaribe só não explicou como foi possível que o Brasil, dirigido pela elite instruída que se preocupava com os interesses de todos, tenha chegado ao terceiro milênio contando com 60% de sua população tão inculta a ponto de seu voto ser desqualificado como pouco republicano.

Agora que os mais pobres conseguiram levantar a cabeça acima da linha da mendicância e da dependência das relações de favor que sempre caracterizaram as políticas locais pelo interior do País, dizem que votar em causa própria não vale. Quando, pela primeira vez, os sem-cidadania conquistaram direitos mínimos que desejam preservar pela via democrática, parte dos cidadãos que se consideram classe A vem a público desqualificar a seriedade de seus votos.

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